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Análise: Mafia 3 tem uma bela história ofuscada por erros básicos

Antes de iniciar esse review, acho interessante que vocês leiam o Preview que fiz do jogo na minha visita aos estúdios da 2K Games na Califórnia. Falo isso porque dessa forma será possível de se entender o porquê da nota que darei no fim deste artigo. Infelizmente, muitos dos pontos que notei quando joguei o jogo pela primeira vez no mês passado e que poderiam tornar Mafia 3 uma experiência aquém do esperado acabaram de fato acontecendo. Leia abaixo a minha análise do título.

CONFIRA 1H DE GAMEPLAY DO JOGO NO FINAL DESTA MATÉRIA

Uma nova família em uma nova época

Mafia 3 se passa em New Bordeaux, versão fictícia muito bem reproduzida da cidade de Nova Orleans. O jogo traz a história de Lincoln Clay, um órfão adotado pela máfia negra local que mais tarde viria a lutar na guerra do Vietnã. Após retornar como veterano, Lincoln se vê traído por algumas das máfias que o acolheram no seu retorno e busca por vingança. Para fazer com que sua máfia prevaleça, o protagonista deve destruir cada um dos diferentes donos dos distritos da cidade através de tiroteios intensos e muito sangue.

Obviamente, Mafia 3 é inserido em um contexto histórico conturbado dos Estados Unidos. Em um momento de busca por direitos civis, a desigualdade entre brancos e negros na sociedade sulista americana está entranhada em todas as partes do jogo. Através de notícias, comentários, músicas e diálogos, o título busca trazer o jogador para dentro do contexto racista da época. Isso acontece desde notícias nas rádios referentes a acontecimentos reais da história até conflitos com a Ku Klux Klan, organização racista presente nos Estados Unidos desde o século XIX. Nesse sentido, é natural que o roteiro do jogo esteja cheio de palavrões e expressões ofensivas, já que o personagem principal faz parte de um dos grupos mais oprimidos da época. É possível, então, de se ter uma clara noção de quão brutal era o preconceito neste contexto. Mafia 3 conduz esta questão muito bem.

Da mesma forma, o jogo aborda o assunto das máfias de forma excelente, mostrando não somente a clássica e batida máfia italiana, mas também máfias menos conhecidas e extremamente poderosas. Isso traz um ar de renovação ao tema, já que a quantidade de filmes, séries e jogos referentes à máfia italiana é enorme. Já era hora de focar um pouco mais nas famílias que, não somente deram muito trabalho para as autoridades americanas, mas também confrontaram a máfia italiana com muita vontade. Mafia 3 não desliza, felizmente, em sua temática: A disputa pelo poder por meio da guerra entre gangues e máfias locais.

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Uma história maravilhosamente bem dirigida

Se tem algo que gostei muito e que devo aclamar com todas as minhas forças neste jogo é sua história. Mafia 3 possui um roteiro muito bem bolado, que trata de trazer intrigas e traições (como um bom roteiro de máfias deve fazer), além de desenvolver extremamente bem todos os personagens. Aliás, a atuação de cada um deles cria uma ligação entre o jogador e o personagem muito bem definida. A vingança de Lincoln Clay é bem justificada e faz com que o jogador queira que ela aconteça de fato.

Isso não acontece por mera questão de sorte, entretanto. O jogo é dirigido por Haden Blackman, conhecido por seus trabalhos nos estúdios da LucasArts. Naturalmente, a chance de ter coisa boa no quesito roteiro era muito grande. Uma das maiores sacadas do diretor foi fazer algo que poucos jogos tentaram, criar uma história no formato de documentário. A ideia é bem simples, mas a sua execução é simplesmente fenomenal. Basicamente, o roteiro do jogo se dá por meio de cutscenes criteriosamente colocadas durante o gameplay. O que quero dizer com isto é que podemos estar no meio de um tiroteio e, do nada, somos transferidos para uma cena com um personagem falando sobre o acontecimento e seu contexto. Junte a atuação incrível por parte de todos os atores, animações extremamente detalhadas, e um roteiro carinhosamente escrito e temos uma parte criativa digna de grandes filmes. Não foram muitas as vezes que um jogo open-world trouxe um enredo e uma história tão envolventes quanto Mafia 3. A experiência de Haden Blackman na LucasArts agregou muita coisa ao enredo como um todo.

Não devo deixar de comentar também da trilha sonora deste jogo. Meu Deus, ela é simplesmente uma das melhores já escolhidas para uma obra. A mesma atua praticamente como um personagem do jogo, entrando perfeitamente em todas as situações e trazendo clássicos da época. Ao associar história, trilha sonora e atuação, Mafia 3 traz uma experiência cinematográfica no quesito enredo e construção narrativa. Todos esses fatores se complementam de forma magistral. Mafia 3 seria digno das grandes tela se fosse a vontade da 2K Games.

Entretanto, paramos por aqui os pontos positivos e vamos para o que de fato faz com que Mafia 3 tenha, infelizmente, entrado na faixa da mediocridade, a sua parte técnica.

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Um desastre em forma de problemas técnicos e jogabilidade genérica

Se por um lado muito carinho foi dado à parte criativa do jogo, o mesmo parece não ter acontecido na parte técnica. Mafia 3 deixa a desejar no que tange ao seu código. Muitas vezes as desenvolvedoras decidem por criar engines próprias para seus jogos com o intuito de ter um software mais adaptado às necessidades dos seus produtos. Isso faz sentido em muitos casos, já que seria complicado utilizar engines prontas para jogos mundo aberto de dimensões e possibilidades diversas, por exemplo. Contudo, tal aposta pode ter seu preço, já que uma engine madura já tem seus bugs, glitches e eventuais erros bem conhecidos. No caso, criar uma engine própria para Mafia 3 deu brecha para que muitos erros surgissem. E quando digo muitos aqui, não estou exagerando, são banais os erros técnicos do jogo. A lista de problemas é bastante grande. Enumerei abaixo alguns pontos importantes para se ter em mente com relação à parte técnica do jogo:

  1. Vamos começar pelos gráficos. Sim, Mafia 3 é lindo. Conforme a Hangar 13 já havia me dito na minha visita aos seus estúdios, a equipe responsável por documentar e detalhar a cidade de Nova Orleans para que ela fosse reproduzida no jogo o fez com muito carinho. Dá para perceber isso em cada distrito percorrido. Os edifícios, as ruas, os bares, os restaurantes, tudo é perfeitamente fiel à realidade de 1968. A cidade é realmente viva em todas as suas esquinas, pântanos e edifícios. Contudo, o que me incomodou muito na ambientação do mapa foram os efeitos meteorológicos. Algo que me aborrece muito em jogos que buscam gráficos muito avançados é o excesso. Sim, ter sombras, cores, efeitos de luz e reflexos traz beleza aos jogos, mas deve-se saber onde parar. Em Mafia 3, por muitas vezes simplesmente fui ofuscado pela quantidade de reflexo do sol no asfalto. Além disso, os efeitos volumétricos estão muito exagerados. Em alguns momentos parecia que eu estava em um planeta de No Man’s Sky com fumaças e nuvens bizarramente alaranjadas (chegam a parecer um plasma de tão forte). Para colocar a cereja no bolo dos erros gráficos, sombras bizarras das nuvens passam em uma velocidade completamente irreal do nada. Todas essas falhas poderiam ser desconsideradas se não fossem tão recorrentes. É claro que patches podem corrigir esses problemas, mas eu ressalto que os mesmos erros já acontecem desde a versão Beta do jogo e não foram corrigidos. Que mancada, 2K Games!
  2. Agora, vamos para a inteligência artificial. Bom, podemos resumir este quesito com um exemplo de missão que completei um pouco antes de tomar o segundo distrito logo no começo do jogo. Basicamente, todos os inimigos se encontravam em posições extremamente óbvias, que facilitaram muito o meu trabalho. Não somente isso, a grande maioria estava de costas fazendo coisas aleatórias, como se estivessem esperando para morrer. O pior de tudo é que muitas missões são recheadas de inimigos e NPCs burros. Eu, com meus vícios de jogador de Hitman, tomei todos os cuidados para que ninguém me visse matando os inimigos até perceber que praticamente não faz diferença se as pessoas virem mortes. Elas simplesmente cagam e não avisam a nenhum inimigo que PESSOAS ESTÃO MORRENDO! Para me deixar ainda mais irritado, quando o momento do tiroteio é chegado, os inimigos também não são inteligentes. Simplesmente todo mundo em posse de uma shotgun tem a coragem exacerbada demais e resolve sair metendo o peito para tomar tiro. Consequentemente, o jogo acaba ficando exaustivo com todos esses problemas.
  3. Para fechar esse ponto, vamos aos famigerados bugs e glitches de Mafia 3. Esses são inúmeros. Experimente colocar “Mafia 3 Bugs” no Google e você verá que em uma semana de lançamento já existe muita coisa na internet. É normal se deparar com vários bugs ao longo da história do jogo. E não estou falando de problemas pontuais, me refiro a coisas básicas como objetos atravessando outros (vi uma porta atravessar a parede e ficar girando eternamente), personagens presos correndo no ar, pessoas andando na água, veículos atravessando outros, carros não ligando… A lista é imensa e TEM que ser corrigida o mais rápido possível pela Hangar 13. Não é aceitável que em pleno 2016 tais erros banais ocorram, ainda mais em um jogo AAA que recebeu maletas de dinheiro para ser produzido (Assassin’s Creed: Unity mandou um abraço).

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Jogabilidade genérica e repetitiva

Por mais que a jogabilidade de Mafia 3 seja aceitável, ela não inova em nada. Com um já batido sistema de missões “Vá do ponto A ao B”, o jogo não tenta trazer novos conceitos ou instigar o jogador a explorar mais do mapa de New Bordeaux. Chega a ser fatigante realizar o mesmo tipo de missão a cada novo distrito que se desbloqueia. O sistema de progressão do jogo se limita a realizar as mesmas ações (como destruir coisas ou matar pessoas) por muitas vezes até que se quebre o esquema da máfia local para então tomar poder da área. A única motivação de fato para se jogar Mafia 3 acaba sendo sua história, já que a jogabilidade não ajuda muito.

Aliás, não me agradou muito a jogabilidade como um todo. Conforme já explicitado no meu Preview do jogo, tudo parece muito genérico. Andar com Lincoln Clay se torna uma tarefa monótona, já que tudo parece mais do mesmo. Não pensem que o Gameplay do jogo seja necessariamente ruim, entretanto, só não há nada que prenda o jogador por muito tempo. Tudo funciona como o esperado (tirando os bugs), mas nada além disso. Não espere a mesma sensação de diversão que a proporcionada por GTA V, por exemplo, mas sim uma um pouco mais travada que Watch Dogs (que não me agradou muito, diga-se de passagem).

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Além disso, algo que me incomodou bastante foram os momentos de tiroteio intenso. Achei difícil de mirar sem a ajuda de mira do jogo. Tudo bem que atirar na vida real não é algo tão fácil quanto pegar em uma arma e apertar o gatilho de forma precisa, mas pra quê tanto tremilique? Esse quesito, junto ao fato de que o hit detection do jogo é extremamente falho, traz momentos de intensa frustração.

Para fechar, devo dizer que minhas sensações ao dirigir no jogo são um tanto paradoxais. Eu gostei e desgostei ao mesmo tempo dela e vocês vão entender o porquê. Os carros parecem estar meio que deslizando demais e não são muito responsivos. Entretanto, entendo completamente que esta seja minha visão pessoal, já que essa dificuldade na dirigibilidade se dá pelo fato de que os carros em 1968 não eram exatamente tranquilos de se dirigir. Agregado a isso, a Hangar 13 optou por trazer realismo na direção dos carros (há inclusive a opção de direção realista nas configurações), ou seja, faz total sentido que a direção não seja tão Arcade quanto eu gostaria.

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Em suma, a jogabilidade de Mafia 3 poderia estar no mesmo nível da sua história, mas acabou sendo somente mais uma em meio a tantos outros jogos do gênero.

Veredito Final

Mafia 3 é uma produção contraditória. Ao mesmo tempo em que o jogo entrega uma história incrível e muito bem narrada, toda a parte técnica tem falhas. A jogabilidade repetitiva só serve de meio para se chegar aos próximos capítulos da história, e não são uma parte da diversão. É uma pena que um jogo com tanto potencial tenha sido entregue com uma jogabilidade tão genérica e repetitiva. Além disso, os bugs e glitches presentes no título colocam mais uma pá de cal no que poderia ser um dos melhores títulos do ano. Mafia 3 é um jogo que poderia ser incrível, mas que acabou se contentando em ser aceitável.

 

{{

game = [Mafia 3]

info = [Lançamento: 07/10/2016]

info = [Produtora: Hangar 13]

info = [Distribuidora: 2K Games]

plataformas = [PS4, Xbox One e PC]

nota = [3/5]

decisão = [Mafia 3 é ofuscado pelos seus erros técnicos]

texto = [Um roteiro incrível que não condiz]

texto = [com a execução genérica da obra]

positivo = [História bem desenvolvida]

positivo = [Trilha sonora incrível]

positivo = [Personagens bem construídos]

negativo = [Muitos bugs]

negativo = [Jogabilidade genérica]

negativo = [Progressão repetitiva]

negativo = [Inteligência Artificial ruim]

}}

 

 

Bernardo Cortez

Formado em Relações Internacionais, Bernardo aproveitou o dom de escrever para algo útil. Músico, viajante, cronista e amante de qualquer coisa que seja relacionada a jogos, seu sonho é ser jornalista na área. Tem um carinho especial por jogos que tragam o melhor de todas as formas de arte que os englobam.

2 Comentários

  1. Umas das melhores analises que pude ler !!!
    Li diversas analises em inglês, mas todas com um ar de defesa do game…
    Mas você foi sincero e não poupou críticas …
    Parabéns …
    Ganhou um seguidor !!!

    1. Muito obrigado, Tiago! Fico extremamente feliz com seu comentário =) Tento sempre mostrar todos os lados dos jogos, afinal, tudo tem seu pontos positivos e negativos. Infelizmente, no caso do Mafia 3, os pontos negativos se sobressaem.

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